sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Distócia de ombros


A distócia de ombros (DO) é uma emergência obstétrica que afecta cerca de 0,6% dos partos e consiste na dificuldade em exteriorizar os ombros do feto após a expulsão da cabeça. Não é possível prever a DO embora existam alguns factores de risco: diabetes, obesidade, bebés com mais de 4 Kg, DO num parto anterior, indução do trabalho de parto, trabalho de parto prolongado e parto assistido por ventosa ou fórceps.
A prevenção da DO é um tema controverso: recomenda-se a programação de cesariana quando a grávida teve DO com sequelas num parto anterior ou quando existe uma estimativa do peso fetal superior a 4 Kg nas grávidas diabéticas ou 4,5 Kg nas restantes (o Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia sugere, respectivamente, 4,5 Kg e 5 Kg).
Perante o diagnóstico de DO devem ser chamadas as pessoas mais experientes do serviço, incluindo um pediatra e um anestesista. Seguidamente realizam-se manobras específicas com vista à libertação dos ombros do feto; as mais simples são a de McRoberts (abdução e flexão coxa sobre o abdómen) e a pressão supra-púbica. Seguem-se manobras internas habitualmente facilitadas pela execução de uma episiotomia. As manobras de terceira linha incluem, por exemplo, a posição de gatas, a manobra de Zavanelli (reintrodução do feto no útero e realização de cesariana) e a secção da sínfise púbica da grávida. É fundamental o treino das equipas obstétricas com recurso, por exemplo, a simuladores disponíveis em centros especializados como os de Coimbra e do Porto.
As consequências para o recém-nascido são a fractura da clavícula (quase sempre sem sequelas), a parésia braquial (lesão neurológica que limita a motricidade do membro superior), lesão da coluna cervical, lesões cerebrais por falta de oxigenação e morte. Do ponto de vista materno há o risco de hemorragia significativa e traumatismo perineal. Após a resolução da distócia de ombros é importante o esclarecimento dos pais acerca do sucedido e dos procedimentos adoptados.
(Imagem: http://www.sharinginhealth.ca/images/shoulder_dystocia_Alison_Martin.jpg)

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

De serviço

Há cinco anos fui multado no Parque das Nações. O carro estava, efectivamente, mal estacionado. A minha estupefacção resultou do facto de muitos outros veículos em iguais circunstâncias mas em ruas paralelas estarem incólumes de multa. Dirigi-me então ao agente da PSP. Explicou-me que se encontrava de serviço ao recém-inaugurado Casino de Lisboa. Para além da vigilância do edifício, a sua missão era zelar pelo cumprimento das regras de estacionamento exclusivamente nas ruas que delimitam o quarteirão. E se houvesse um assalto um pouco mais à frente? Jamais abandonaria o seu posto, disse-me, acrescentando que contactaria a central.
Na semana passada fui ao hospital onde, no 2.º semestre de 2011, estive a trabalhar. O meu objectivo era registar os resultados anátomo-patológicos das doentes que tinha operado. Ao atravessar o átrio principal hesitei acerca do local onde iria consultar o sistema informático. Acabei por escolher a sala de médicos do Bloco de Partos. Ao entrar fui recebido com entusiasmo, revi os excelentes profissionais que lá trabalham e de quem tinha saudades. Cruzei-me com a madrinha da minha filha mais velha que se encontrava de serviço e ficou combinado almoçarmos juntos após a cesariana que iria começar. Enquanto assentava os resultados dos exames na minha base de dados chegou uma enfermeira que anunciou o mal-estar de uma grávida durante a realização do CTG. Como os colegas de serviço estavam ocupados observei-a e fiz o diagnóstico de descolamento da placenta. Prepararem-na para cesariana urgente! Na sala principal a outra intervenção tinha se complicado e impôs-se abrir a segunda sala, activar o segundo anestesista e reunir outra equipa obstétrica. Acabei por mudar de roupa num ápice, desinfectar-me e operar a doente com a ajuda de uma colega que entretanto chegou. O bebé, de 36 semanas, nasceu cheio de vida, mostrando que tínhamos actuado com rapidez e eficácia. Nunca me passou pela cabeça argumentar que não estava de serviço.